#1 Encontro Videográfico: 7, 8 e 9 de Janeiro


Eduardo Matos




Sarro (2008/09); Vídeo digital; 3:4 cor/ sem som/ 6' 54''


Conversa com Pedro Cabral Santo dia 8, 6ºfeira, às 19h




Mote Introdutório da Conversa
Aida Castro

Isto não é uma exposição. A TÉLÉTHÈQUE é o primeiro projecto da Plataforma Ma, e, por isso mesmo, uma espécie de carta de intenções antecipada. Antes de tudo, encontramo-nos com alguma regularidade como se se tratasse da urgência de um qualquer afazer. O epicentro sobre o qual se têm debruçado estas reuniões é elementar, no entanto obstinado: a hipótese de construir um arquivo sobre trabalhos videográficos de artistas contemporâneos. Decidimos começar por esta circunstância e logo se levantaram problemas. Bastaria revelar que o artista convidado para a primeira sessão em vez de conceder um trabalho de vídeo para partilhar o impulso arquivístico, ofereceu primeiro uma das pequenas peças esculpidas da lama seca colhida num leito (esquecido) pantanoso e periférico. Sim, uma das muitas peças que estão em cima da mesa com a particularidade da presenteada estar em processo (grave) de desintegração. Em devir-pó. Obrigado Eduardo. Pois essa oferenda coloca, pelo menos, duas questões fundamentais para o convite à TÉLÉTHÈQUE. Por um lado a constatação da impossibilidade de algumas categorizações como, por exemplo, “videoartista”, e, por outro, a dificuldade de arquivar e preservar peças contemporâneas. Tanto o vídeo proposto para esta TÉLÉTHÈQUE como as esculturas de lama são essencialmente efémeros. 

A escolha de Eduardo Matos para a abertura destes encontros não é, pois, insuspeita, coordena-se em plenitude com esta proposta da Plataforma Ma e também com o seu trabalho a longo termo. Ou melhor, perfaz (sublinha) mas desde logo problematizando. Na verdade começamos ao contrário: a TÉLÉTHÈQUE é um formato temporário de um arquivo que se quer activo. Um arquivo que está a ser acrescentado, documentado, estudado, reflectido e consultado consecutivamente e em permanência. Um arquivo constituído por todos os que se encontram com ele. O vídeo que o Eduardo nos traz para ser evocação de uma conversa é aliás sobre isto e intitula-se Sarro. Nas sucessivas expedições aos locais eleitos, Eduardo Matos tal qual um arqueólogo recolhe, fixa e documenta ora em vídeo ora em fotografia todos os elementos do seu interesse. Neste caso em particular a opção foi o registo videográfico num plano fixo de objectos isolados e encontrados numa casa antiga e abandonada de um local porventura não litoral. Estas imagens dos objectos, os fragmentos recolhidos de uma certa realidade, entram aleatoriamente no atelier e saem dispostos numa nova ficção. Por ficção deseja-se aqui acrescentar a ideia de modelação, de colocação de um fragmento perante um outro, que depois instituirá um novo todo. E também enquanto significado de uma operação primeiro de distanciamento e posteriormente de interligação entre o “trabalho de campo” e o espaço de reflexão, criação e proposta sobre algo. 




É o conjunto dos fragmentos (des) ou (re) construídos que está no monitor da TÉLÉTHÈQUE, sendo que é esta a hipótese de arquivo que queremos abordar e cometer. Os objectos do cimo da mesa também não são inoportunos, e convivem francamente com outras reconfigurações habituais de Eduardo Matos. A mesa tem sido um elemento fulcral nas suas materializações e o topo desta escultura alberga regularmente visões ou planos de destruição. Nesta sessão teremos acesso claro a estas suspeições que anunciam um futuro de penumbra sempre com base no encontro do passado, mas também ao seguinte: enquanto os objectos-imagens do vídeo do monitor são fragmentos respigados do encontro com um espaço real, os objectos-esculturas da mesa são concepções e simulacros de utensílios pessoais e quotidianos fabricados a partir da matéria recolhida nas expedições. Estamos então perante actos imagéticos contraditórios.

“A minha mãe esfregava-me o Sarro das costas”, disse o Eduardo numa conversa anterior a este momento, chamando também a atenção para o outro significado vernacular da palavra: “sabes o que quer dizer Sarro? É o depósito que fica no fundo de uma garrafa de vinho.” O que resta de sólido e o que é rasto composto de um qualquer outro.




Notas Biográficas:
Eduardo Matos nasceu no Rio de Janeiro, Brasil, vive e trabalha entre Porto e Lisboa. Formou-se em Artes Plásticas – Pintura pela Faculdade de Belas Artes Universidade do Porto (FBAUP). Mestrado em Práticas Artísticas Contemporâneas pela FBAUP. Trabalha desde 1999 como artista plástico. No seu percurso tem vindo a desenvolver trabalhos onde cruza a linguagem imagem/vídeo/escultura com a tridimensionalidade espacial e interactuante de instalações – reconstruindo e desconstruindo especificamente em cada lugar e a cada momento as peças que compõem o simulacro de um jogo de metáforas estéticas, identitárias, sociais, políticas e geográficas. Foi membro fundador do Salão Olímpico, (projecto independente para as artes plásticas), que em 2007 edita com José Maia, Museu de Arte Contemporânea Serralves e Centro Cultural Vila Flor, o livro “Salão Olímpico 2003/06”.

Pedro Cabral Santo nasceu em Lisboa. Actualmente vive e trabalha em Lisboa. Licenciado em Artes Plásticas – Pintura, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL), é também docente na Escola Superior de Artes e Design – Caldas da Rainha. Tem desenvolvido o seu trabalho ao longo da última década em duas facetas: como artista plástico e comissário. O seu trabalho individual situa-se sobretudo na área do vídeo e da instalação e estende-se a colaborações na área teatral através do projecto POGO Teatro e a diversos projectos na área da música. Para além de Portugal, já expôs em Barcelona, Amesterdão, Oslo, Telavive, Londres, Nîmes, São Francisco e Glasgow.